“Escrever!
Gozo e sofrimento dos ociosos! Escrever!”
Gabrielle
Colette, A Vagabunda.
Tenho pensado em
escrever não apenas contos ou crônicas aqui no blog, vou escrever sobre outras
coisas também, como os livros que tenho lido [ou já li], os filmes a que
assisti [como já fiz escrevendo sobre o filme Anni felici], ou peças teatrais. Pretendo fazer isso porque a ideia
inicial deste blog era exercitar a escrita, e escrever é uma atividade que se
desdobra em diferentes modos. Então vamos compartilhar uma [algumas, outras]
experiência[s].
Na semana passada
comecei a ler o romance A Vagabunda (1910)
de Gabrielle Colette. Não a conhecia. Nunca tinha ouvido falar na escritora até
me deparar com algumas referências a ela e a esse romance em “O Segundo Sexo”
de Simone de Beauvoir. Fiquei curiosa, [o livro de Simone de Beauvoir tem sido
muito importante para mim – o descobri tarde, eu sei, em breve tentarei escrever
sobre ele também.], e como ela faz muitas referências literárias eu achei que
seria interessante explorar essas indicações.
Procurei informações na
internet sobre Colette, sobre esse romance, sobre outros que ela escreveu, não
encontrei muita coisa, mas dei com o livro. E comecei logo esta nova tarefa.
Eu sei que parece
precipitado [e talvez seja mesmo] escrever sobre um romance do qual nem bem
terminei a primeira parte. Mas, sabe aquela leitura que te prende já nas
primeiras linhas? Foi o que aconteceu comigo e A Vagabunda. Estou me deixando levar por essa surpresa. Não criei
expectativas, apenas comecei e a leitura está fluindo.
O que Colette escreve
que me deixou assim agitada, eufórica para compartilhar esta leitura? Ou, como
Colette escreve?
A vagabunda em questão
é Renée, atriz, escritora e dançarina de music
hall que abandonou o marido, um pintor, depois de suportar por bastante
tempo as traições dele [mas isso a gente só descobre na medida em que a
conversa com Renée segue]. É isso que desde o começo tem me entusiasmado.
Colette conta a história pela voz da própria personagem, tudo é narrado em
primeira pessoa. Mas não tem um histórico de vida como se o início das venturas
e desventuras de Renée coincidisse com o romance, as lembranças surgem, as
coisas acontecem enquanto a vida vai seguindo. Ela nos descreve as estações do
ano, seu apartamento, o lugar onde trabalha, as pessoas que encontra, as
conversas que tem com seus amigos sem ter uma ordem no que acontece.
Sinto-me conversando
com Renée, indo passear com sua cachorra ou sentada ao seu lado ouvindo essas
histórias. Ela é uma mulher
emancipada, que teve de lidar com a separação, com as cobranças, com a culpa [que
os outros, inclusive alguns amigos, lhe imputam] sobre as traições do marido. E
Renée segue, e acostuma-se com a solidão.
vagabunda, seja, mas resignada, resignada como
estes que aqui estão, companheiros, irmãos, ao círculo vicioso do destino...
meu deus! como eu era jovem e como o amava, como
amava aquele homem! e como vim a sofrer!
oh! poderei procurar por toda parte, por todos os
cantos, debaixo da cama; não há vivalma aqui, ninguém a não ser eu. o grande
espelho do meu quarto já não devolve a imagem maquilada de uma boêmia de music hall, reflete apenas... apenas
eu.
É sempre com um grande suspiro que fecho a porta de
casa. suspiro de fadiga, de tédio, de alívio,
ou de angustiosa solidão? É melhor nem procurar saber, é bem melhor!