quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Leitura - A Vagabunda


“Escrever! Gozo e sofrimento dos ociosos! Escrever!”
Gabrielle Colette, A Vagabunda.


Tenho pensado em escrever não apenas contos ou crônicas aqui no blog, vou escrever sobre outras coisas também, como os livros que tenho lido [ou já li], os filmes a que assisti [como já fiz escrevendo sobre o filme Anni felici], ou peças teatrais. Pretendo fazer isso porque a ideia inicial deste blog era exercitar a escrita, e escrever é uma atividade que se desdobra em diferentes modos. Então vamos compartilhar uma [algumas, outras] experiência[s].




Na semana passada comecei a ler o romance A Vagabunda (1910) de Gabrielle Colette. Não a conhecia. Nunca tinha ouvido falar na escritora até me deparar com algumas referências a ela e a esse romance em “O Segundo Sexo” de Simone de Beauvoir. Fiquei curiosa, [o livro de Simone de Beauvoir tem sido muito importante para mim – o descobri tarde, eu sei, em breve tentarei escrever sobre ele também.], e como ela faz muitas referências literárias eu achei que seria interessante explorar essas indicações.

Procurei informações na internet sobre Colette, sobre esse romance, sobre outros que ela escreveu, não encontrei muita coisa, mas dei com o livro. E comecei logo esta nova tarefa.

Eu sei que parece precipitado [e talvez seja mesmo] escrever sobre um romance do qual nem bem terminei a primeira parte. Mas, sabe aquela leitura que te prende já nas primeiras linhas? Foi o que aconteceu comigo e A Vagabunda. Estou me deixando levar por essa surpresa. Não criei expectativas, apenas comecei e a leitura está fluindo.

O que Colette escreve que me deixou assim agitada, eufórica para compartilhar esta leitura? Ou, como Colette escreve?

A vagabunda em questão é Renée, atriz, escritora e dançarina de music hall que abandonou o marido, um pintor, depois de suportar por bastante tempo as traições dele [mas isso a gente só descobre na medida em que a conversa com Renée segue]. É isso que desde o começo tem me entusiasmado. Colette conta a história pela voz da própria personagem, tudo é narrado em primeira pessoa. Mas não tem um histórico de vida como se o início das venturas e desventuras de Renée coincidisse com o romance, as lembranças surgem, as coisas acontecem enquanto a vida vai seguindo. Ela nos descreve as estações do ano, seu apartamento, o lugar onde trabalha, as pessoas que encontra, as conversas que tem com seus amigos sem ter uma ordem no que acontece.

Sinto-me conversando com Renée, indo passear com sua cachorra ou sentada ao seu lado ouvindo essas histórias. Ela é uma mulher emancipada, que teve de lidar com a separação, com as cobranças, com a culpa [que os outros, inclusive alguns amigos, lhe imputam] sobre as traições do marido. E Renée segue, e acostuma-se com a solidão.



vagabunda, seja, mas resignada, resignada como estes que aqui estão, companheiros, irmãos, ao círculo vicioso do destino...


meu deus! como eu era jovem e como o amava, como amava aquele homem! e como vim a sofrer!


oh! poderei procurar por toda parte, por todos os cantos, debaixo da cama; não há vivalma aqui, ninguém a não ser eu. o grande espelho do meu quarto já não devolve a imagem maquilada de uma boêmia de music hall, reflete apenas... apenas eu.


É sempre com um grande suspiro que fecho a porta de casa. suspiro de fadiga, de tédio, de  alívio, ou de angustiosa solidão? É melhor nem procurar saber, é bem melhor!